Carta aberta à sociedade

Diante da recente determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), que restringe a concessão judicial de tratamentos não incorporados no Sistema Único de Saúde (SUS), viemos a público nos manifestar. 

Primeiramente, reconhecemos que a decisão da suprema corte busca trazer mais racionalidade e previsibilidade à judicialização da saúde. Entretanto, é essencial destacar como alguns dos critérios estabelecidos podem criar desafios significativos para os pacientes que necessitam de tratamentos específicos. Vamos esclarecer esses pontos.

O STF condicionou a concessão de medicamentos à sua incorporação no SUS, exigindo evidências científicas robustas, como estudos randomizados em larga escala. Essa exigência, embora baseada em boas práticas de avaliação, desconsidera que tratamentos inovadores, principalmente para doenças raras, frequentemente não contam com estudos amplos devido à baixa prevalência dos casos. Sugerimos que outros tipos de evidência científica, como estudos observacionais, também sejam considerados em situações excepcionais.

Além disso, é importante lembrar que medicamentos registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já passaram por rigorosas avaliações de segurança e eficácia, seguindo padrões internacionais e nacionais que garantem sua segurança. Essas avaliações incluem análises aprofundadas de dados clínicos, estudos de toxicidade, e inspeções das boas práticas de fabricação, assegurando que os medicamentos atendam aos requisitos mínimos necessários para proteger a saúde da população.

Nesse sentido, deve ser observado o processo regulatório estabelecido e garantir que o direito constitucional à saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal, seja efetivamente resguardado. É preciso assegurar o acesso àqueles que necessitam de tratamento, especialmente quando a burocracia ou limitações estruturais do sistema de saúde colocam em risco a vida dos cidadãos.

Não podemos ignorar que a decisão impacta não apenas as pessoas com doenças raras — que representam cerca de 13 milhões de brasileiros —, mas também pacientes com doenças crônicas e oncológicas que necessitam de tecnologias inovadoras de alto custo. Todos esses cidadãos enfrentam barreiras adicionais para acessar tratamentos que podem salvar ou melhorar suas vidas.

Sabemos que os recursos públicos são limitados. Contudo, em 2023, o Ministério da Saúde destinou aproximadamente R$ 1,4 bilhão para medicamentos não incorporados ao SUS, o que representa apenas 0,028% do orçamento da União. Esses dados mostram que o custo financeiro, embora relevante, pode ser administrado de forma mais eficiente por meio de processos formais e transparentes.

Reforçamos que não defendemos a judicialização como solução prioritária. Pelo contrário, nosso pleito é por um sistema de saúde mais eficiente, com processos administrativos céleres e acessíveis. O tempo é crucial para pacientes com doenças progressivas e incapacitantes, pois a demora no tratamento pode levar à perda irreversível de funções vitais ou mesmo à morte.

Por isso, destacamos a urgência de se investir em políticas públicas que garantam um sistema de saúde inclusivo e responsivo. A decisão do STF exige um olhar atento, pois sua implementação inadequada pode trazer consequências graves para milhares de brasileiros.

Convidamos a sociedade, os gestores e os legisladores a refletirem sobre a importância de construir um sistema de saúde que assegure o direito fundamental à vida e à saúde, priorizando soluções que realmente atendam às necessidades da população.